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Dra. Maria José Passos

Oncologista

 

 

Dra. Maria José Passos

Melanoma

Informar para prevenir

HPA Magazine 20

O que é o melanoma?
O melanoma cutâneo é o tumor maligno dos melanócitos que são as células responsáveis pela pigmentação da pele. Apesar de ser um tumor relativamente raro, representa cerca de 5 a 10% das neoplasias malignas cutâneas e é o tumor mais letal, responsável por cerca de 80% das mortes por cancro cutâneo.
Pode apresentar-se como um “sinal” castanho ou negro, mas mais raramente pode ser rosado ou branco (melanoma amelanótico). 
Pode atingir qualquer grupo etário e é relativamente frequente em adultos jovens (<30 anos) e raro na infância. O risco de desenvolver melanoma é sobreponível nos dois sexos, com diferenças consoante os países. Aparece com mais frequência nos indivíduos caucasianos, mas pode surgir também na raça negra.



 

Quais são os sintomas e sinais de alerta?
No início da doença, habitualmente não há sintomas; poderão ocorrer algumas alterações morfológicas suspeitas ao nível dos sinais (nevos), nomeadamente o aumento de dimensões, alteração da cor, assimetria dos bordos, ulceração ou sangramento (critérios ABCDE).
O aparecimento de prurido (comichão), hemorragia, ulceração sobre uma lesão pré-existente também pode ser suspeito de lesão maligna e deve levar o doente ao médico.
Todas as pessoas devem conhecer e estar atentas aos sinais de alerta. O melanoma pode aparecer em qualquer localização do corpo, mesmo em áreas não expostas ao sol, como as palmas das mãos e plantas dos pés, como acontece na raça negra. Não esquecer que as pessoas de pele clara, olhos azuis ou verdes, louras ou ruivas, com múltiplos nevos atípicos são mais sensíveis ao sol e devem ser observadas regularmente em dermatologia, devendo ser fotografadas todas as lesões. Se alguns destes sinais sofrerem alterações da sua morfologia devem ser retirados. É fundamental que todos saibam que é importante vigiar as alterações morfológicas dos sinais e o aparecimento de novas lesões cutâneas, consultando periodicamente o seu médico.Devem ser evitados todos os comportamentos de risco e deverão ser seguidos os Conselhos da Liga Portuguesa contra o cancro.  
A nível da prevenção o que deve ser feito e quais os grupos de risco?
Apesar dos grandes avanços terapêuticos da última década, a prevenção e o diagnóstico precoce continuam a ser as melhores armas para combater o melanoma. Como é evidente é melhor evitar o aparecimento do melanoma, ou se isso não for possível, diagnosticá-lo nos estádios iniciais. Sabemos que a taxa de sobrevivência ao fim de 5 anos é de 95% para o estádio I, com espessura inferior ou igual a 1mm, mas cai para 62% quando há envolvimento ganglionar regional, e para 20% nos tumores avançados (estádio IV), o que é elucidativo da importância do diagnóstico precoce. 
Os principais fatores de risco estão bem estabelecidos. As pessoas de pele clara, sardentas, ruivas ou louras (fotótipos I e II), de olhos claros, nevos atípicos, com história de exposição solar intensa e intermitente (escaldões), sobretudo na infância, têm maior risco de desenvolver melanoma. Salienta-se ainda a importância dos antecedentes pessoais e familiares de melanoma e a imunossupressão que representa também um fator de risco para o desenvolvimento de melanoma. 
Neste momento, qual é a prevalência do melanoma?
O melanoma é o cancro com maior aumento de incidência entre os caucasianos, com um aumento de incidência anual de 3 a 7% nos EUA e com uma duplicação das taxas de incidência e mortalidade a cada 10-20 anos.
A incidência de melanoma continua a aumentar em todo o mundo, sobretudo nos EUA, Austrália e Norte da Europa. Em Portugal, de acordo com os dados de 2020 do Globocan, estima-se que a prevalência aos 5 anos seja de 3488 casos (taxa de 34,2%) e a incidência de 1071 com mortalidade de 289/ano, acreditando-se que estes dados estejam seguramente subestimados, sobretudo devido à pandemia.
Sabemos que em 2020, houve redução do nº de diagnósticos de melanoma e os que foram detetados estavam em fase mais avançada. Esta realidade foi transversal a vários países entre os quais Portugal. No futuro teremos nºs mais robustos sobre este período e com certeza conclusões mais informadas.
As causas do aumento de incidência devem-se a vários fatores: genéticos, ambientais e estão sobretudo relacionadas com comportamentos de risco que devem ser evitados. Destaco a exposição solar excessiva, crónica ou intermitente (“escaldões”) entre as 12-16h, altura em que a radiação ultravioleta é mais perigosa; desaconselho a ida aos solários e exposição solar intensa, sobretudo durante a infância. 
Desde há muitos anos que os dermatologistas portugueses desenvolvem um excelente trabalho na área da prevenção e diagnóstico precoce do melanoma, mas infelizmente ainda nos aparecem muitos casos de melanoma diagnosticados em fase avançada e negligenciados durante anos.
É preciso continuar a trabalhar no sentido de desenvolver novas estratégias de prevenção e investir na educação/formação em oncodermatologia por parte da sociedade civil e dos profissionais de saúde, com destaque para os médicos de medicina geral de familiar.

 

Ao nível terapêutico, quais são os tratamentos atualmente disponíveis para o melanoma? Existem terapias mais inovadoras, como por exemplo os biofármacos?
A cirurgia continua a ser o tratamento de eleição para o melanoma em fase inicial (estádios I) com uma taxa de cura superior a 90%. No entanto, os doentes com melanoma de alto risco em estádio IIB e CIII na altura do diagnóstico e o melanoma metastizado (estádio IV) têm uma abordagem terapêutica distinta e mais complexa. Nestes casos, o prognóstico não é tão favorável, embora na última década se tenham registado avanços significativos no tratamento médico do melanoma de alto risco e avançado, com a utilização da imunoterapia com inibidores de check-point e terapêuticas dirigidas nos melanomas com mutação BRAF.   
Desde 2011 até agora têm surgido novos fármacos, com diferentes mecanismos de ação, que demonstraram um aumento da sobrevivência em doentes, primeiro com melanoma avançado e, atualmente também em estádios mais precoces. Foi o caso da imunoterapia (inibidores de checkpoint CTLA-4 e PD1) e terapêuticas dirigidas para os doentes com mutação no gene BRAF. Ao contrário da quimioterapia antineoplásica, a imunoterapia atua sobre o hospedeiro e não diretamente sobre o tumor, modulando as respostas imunológicas do organismo, de modo a que este consiga lutar de forma eficaz e duradoura contra o melanoma. 
O mecanismo de ação dos diferentes agentes imunológicos condiciona as respostas clínicas e os efeitos secundários de causa autoimune. Em regra, estes efeitos são controláveis, quando reconhecidos e tratados precocemente com corticoides. 
A imunoterapia e as terapêuticas-alvo, agora utilizadas no tratamento desta doença, levaram a um aumento de sobrevivência global e a respostas duradouras, transformando muitas vezes uma doença agressiva em doença crónica com poucos sintomas. 
Atualmente nos nossos hospitais tratamos os doentes com melanoma com estes novos agentes (imunoterapia em combinação e/ou monoterapia) e inibidores BRAF+ inibidores MEK, na doença avançada e mais recentemente também em adjuvância nos estádios III, o que representou mais um avanço importante no tratamento dos portugueses com melanoma de alto risco e metastizado.
Que expectativas nos aguardam num futuro próximo? 
Espero que o ano de 2023 seja um ano de progresso e recuperação da atividade   das nossas Instituições, não descurando a prevenção primária e o diagnóstico precoce do cancro, nomeadamente o melanoma, mas outros cancros cutâneos. 
Queria deixar uma mensagem de esperança e otimismo a todos os nossos doentes com melanoma. O advento da imunoterapia com inibidores de checkpoint e as terapêuticas dirigidas anti-BRAF/MEK mudaram radicalmente a história natural do melanoma, destronando definitivamente a quimioterapia antineoplásica e demonstrando uma eficácia incomparável, em contexto metastático e agora também adjuvante. 
Temos ainda muitos desafios pela frente, mas a revolução continua...