Em idade pediátrica, o sono reveste-se de particular importância para o desenvolvimento físico, cognitivo e emocional.
A nível orgânico, é importante na regulação do crescimento (pela secreção da hormona do crescimento), na homeostasia (equilíbrio) cerebral (pela limpeza de subprodutos metabólicos e seleção de ligações neuronais), risco cardiovascular (pela diminuição de parâmetros de acordo com as fases do sono) e metabólico (melhor perfil glicémico e menor risco de obesidade) e, inclusive, foram encontradas associações da privação de sono a uma pobre função imunológica.
O sono participa ainda na consolidação da memória e aprendizagens, estando descritas no caso da sua privação e sonolência diurna, a diminuição das capacidades cognitivas, com menor êxito académico, pior memória a curto e longo prazo, impulsividade, perturbação da atenção e desenvolvimento linguístico. Também está identificada a sua relação com o humor da criança (com acentuação das emoções negativas/depressivas).
A privação do sono pode comprometer a saúde, orgânica e cognitiva, sendo crucial estabelecer hábitos de sono saudáveis com rotinas e um ambiente adequado para garantir o bem-estar da criança e família.
A Consulta do Sono Infantil destina-se a abordar qualquer questão ou problema que os pais ou criança (no caso dos mais velhos) considerem relacionado com o sono infantil. Esta abordagem tem em conta a individualidade da criança e família em causa, ajustando os elementos previsíveis e fisiológicos para aquela idade, às necessidades e problemas e espectativas da família. Destina-se à faixa etária dos “0 aos 18 anos” e distingue-se da consulta de Pediatria Geral, pela dedicação aprofundada e exclusiva ao Sono, segundo protocolos e orientações baseados no conhecimento atual da ciência do sono infantil.
Esta consulta é dirigida, de uma forma geral, quando as famílias consideram que o sono dos seus filhos está a ser prejudicial para a dinâmica do próprio ou família. De forma mais concreta, quando são identificados, a título de exemplo, insónias, despertares noturnos e fragmentação do sono, atraso no início da fase do sono, movimentos excessivos ou considerados anormais, sonolência excessiva diurna, apneia do sono, dificuldades de concentração ou alterações comportamentais.
Identificação do principal problema considerado pela família
Este passo permite compreender de forma clara as preocupações específicas da família, garantindo que a intervenção terapêutica seja direcionada às necessidades reais da criança e promova melhores resultados para o seu sono e bem-estar.
História clínica completa
Considerando a envolvente social da criança e família.
Estabelecer o cronótipo da criança
Os horários em que o corpo da criança "prefere" dormir, acordar e estar mais ativo ou alerta.
Caracterização do período circadiano
Período do dia (horário de refeições, exercício, exposição a écrans, luz e sons, dinâmica familiar, período de sono diurno) e do período noturno (rituais, rotinas, caracterização do sono).
Identificação, proposta terapêutica
Orientação para problemas médicos que possam ser responsáveis pela perturbação do sono identificada (por ex.º pele atópica, obstipação, roncopatia, défice de ferro, entre outras).
Aplicação de escalas/questionários
Segundo protocolos de acordo com a idade, destinados a contribuir para a identificação de problemas de sono como são exemplo, a escala de Brief Infant Sleep Questionnaire (BISQ), o BEARS - Sleep Screeing Tool e a BRUNI - e Sleep Disturbance Scale for Children.
Fornecimento de um diário do sono
A preencher em ambulatório (para apoiar a intervenção terapêutica).
Depois de identificado e caracterizado o problema é proposta uma intervenção terapêutica inicial, com otimização dos fatores biológicos, sociais e ambientais adequados à idade, medidas cognitivas-condutais e eventual início de terapêutica se identificada alguma condição médica que influencie o sono.
Nestes casos, salienta-se a referenciação e articulação com especialidades como otorrinolaringologia, medicina dentária, imunoalergologia ou neuropediatria quando necessário.
Conforme o identificado previamente e de acordo com a necessidade, pode ainda ser solicitada uma avaliação analítica, radiográfica (por ex.º cavum e ortopantomografia), actigrafia e polisonografia (nos mais velhos).
Após a intervenção inicial, na consulta subsequente são avaliadas a resposta às medidas e medicação instituídas, reforçadas novas medidas possíveis, terapêutica dirigida à patologia orgânica identificada em casos selecionados e com base em critérios, podendo ainda ser associados fármacos indutores do sono, como a Melatonina.
A Consulta do Sono, ao promover um sono estruturalmente adequado à idade da criança em causa, pelas suas várias intervenções, proporciona benefícios para a criança e família.
Para a criança, são registadas melhorias ao nível do comportamento e das emoções (menos agitação e impulsividade, menos agressividade ou humor negativo), otimização do desenvolvimento cognitivo, melhoria nas aquisições e desempenho escolares. Também no âmbito da biologia, benefícios endócrinos (potencial de crescimento, flutuação hormonal circadiana adequada), metabólicos e cardiovasculares e, segundo estudos recentes, até imunológicas.
Para a família, menos stress associado à parentalidade e às exigências sociais e laborais, com maior disponibilidade mental para os filhos e consequentemente um fortalecimento do vínculo (ligação entre pais e filhos). Eventualmente, melhor organização do tempo e maior facilidade em encarar os desafios da parentalidade.
A Consulta do Sono Infantil é de extrema importância para o desenvolvimento adequado físico, cognitivo e emocional da criança, além de melhorar a qualidade de vida familiar. Com a identificação e tratamento de distúrbios do sono, são prevenidos problemas, como dificuldades de aprendizagem, alterações de humor e comportamento, e até mesmo o desenvolvimento de doenças crónicas, assegurando um crescimento saudável e bem-estar para a criança e a família.